GRAPPA – Atualização das recomendações de artrite psoriásica – 2021/2022

Olá pessoal! Vamos de atualização?

Em junho desse ano o GRAPPA (Group for Assessment of Psoriasis and Psoriatic Arthritis) públicou suas mais recentes recomendações para o tratamento de artrite psoriásica (Apso), atualizando o último guideline de 2015.

À medida que são desenvolvidas cada vez mais medicações para o tratamento da Apso, é importante que existam recomendações para guiar nossa prática clínica. A recomendação do GRAPPA é uma das mais importantes entre as existentes – ACR (American College of Rheumatology), EULAR (European Alliance of Associations for Rheumatology) e da NFP (National Psoriasis Foundation).

O GRAPPA orienta sua abordagem em 6 grandes domínios da doença, sendo eles: artrite periférica, envolvimento axial, psoríase cutânea, psoríase ungueal, entesite e dactilite. Essa abordagem é interessante por considerar a diferente eficácia das terapias nessa doença tão heterogênea.

A nova recomendação também aborda duas doenças relacionadas, que são a doença inflamatória intestinal (DII) e a uveíte, doenças com relação fisiopatológica com a Apso e considera a forte sobreposição entre o tratamento dessas condições.

Outro ponto enfatizado é o da importância das comorbidades frequentes nos pacientes com Apso e que impactam diretamente na escolha da terapia/resposta ao tratamento, como obesidade, risco cardiovascular, doença hepática gordurosa não alcoólica, distúrbios do humor, além dos riscos infecciosos relacionados ao uso de imunobiológicos, risco de malignidade, sensibilização central e saúde reprodutiva.

Confere o fluxograma de tratamento abaixo e o texto para entender melhor.

Adaptado e retirado de: Coates, L.C., et al Nat Rev Rheumatol (2022). https://doi.org/10.1038/s41584-022-00798-0

Recomendações

Princípios gerais

O objetivo da terapia é alcançar o menor nível possível de atividade de doença em todos os domínios. A definições de baixa/mínima atividade de dença ou remissão foram aceitas como meta para otimizar o estado funcional, melhorar a qualidade de vida e o bem-estar e prevenir danos estruturais.

A avaliação de pacientes com APso requer consideração de todos os domínios da doença, incluindo artrite periférica, doença axial, entesite, dactilite, psoríase cutânea, psoríase ungueal, uveíte e DII. O impacto da doença sobre dor, função, qualidade de vida e danos estruturais devem ser examinados.

As métricas mais amplamente aceitas que foram validadas para APso devem ser utilizadas sempre que possível.

As decisões terapêuticas precisam ser individualizadas e tomadas em conjunto pelo paciente e seu clínico. O tratamento deve refletir as preferências do paciente, fornecendo-lhe as melhores informações sobre as opções relevantes. As escolhas de tratamento podem ser afetadas por vários fatores, incluindo atividade da doença, terapias anteriores, comorbidades, custo e conveniência.

Uso de biossimilares

Quanto ao uso de biossimilares, a recomendação fala sobre a importância da decisão conjunta (médico epaciente) sobre a troca da medicação, considerando os benefícios principalmente relacionados a farmacoeconomia, porém atenção deve ser dada ao risco de múltiplas trocas (mais estudos necessários), a importância da farmacovigilância e necessidade da monitorização da imunogenicidade.

Desmame de biológicos

Em relação a redução da dose de biológico, houve uma menor concordância entre os avaliadores, principalmente nos grupos que não atingiram a remissão (paciente com baixa/mínima atividade de doença). Os benefícios da redução são claros e incluem menor risco de efeitos adversos e benefícios farmacoeconômicos. É possível que a doença reative, com demora para se alcançar nova remissão, ou até mesmo que ela não seja novamente alcançada. As discussões entre o paciente e o médico devem informar a abordagem ideal de redução gradual para cada individuo (ex. diminuir a dose x aumentar o intervalo de tratamento).

Tratamento

  • Considera abordagem ‘step-up’, começando com terapias tópicas para a psoríase e medicamentos modificadores do curso da doença (MMCDs) para artrite, bem como vias de tratamento mais rápidas como medicamentos modificadores do curso da doença biológicos (MMCDb) ou sintéticos direcionados MMCD (MMCDsd) podem ser usados como terapia de primeira linha, se disponíveis.
  • Sempre que possível, o tratamento para um indivíduo com APso deve englobar todos os domínios ativos de doença e condições relacionadas, mas muitas vezes pode ser direcionado pelos domínios mais graves ou impactantes da doença.
  • Até o momento, os estudos de comparação direta (head-to-head) em Apso são limitados e disponíveis apenas para iTNF x IL-17A e iTNF x iJAK. Nesses ensaios, foram observadas respostas semelhantes de ACR20 entre os tratamentos, mas diferenças claras na resposta foram evidenciadas em outros domínios, prinicipalmente pele e acometimento axial.
  • Existem estudos limitados em Apso axial, portanto, o tratamento geralmente segue evidências de estudos com espondiloartrite axial (EpAx) mais amplos. Vários medicamentos que são eficazes na artrite psoriática periférica são ineficazes em ensaios de espondilite anquilosante, incluindo vários MMCDs, IL12/23i, apremilast e IL-23i. Assim, a presença de doença axial em um paciente direciona a seleção do tratamento.
  • Quanto a pele foram mostrados resultados superiores do PASI com IL-17i em comparação aos iTNFs. Estudos em paciente com psoríase pura também demonstraram que novas terapias, como IL23i, têm resultados superiores para pele.
Artrite periférica
  • Recomendação condicional: anti-inflamatório não esteroidal (AINEs), glicocorticóides orais e intra-articulares para alívio sintomático.
  • Pacientes naives
  • Recomendação forte
    • MMCDs (metotrexato, sulfassalazina ou leflunomida)
      • Dados observacionais
      • Fácil acessibilidade
    • iTNFs
      • Estudos recentes de alta qualidade apoiam a superioridade dos iTNFs aos MMCDs como terapia inicial, principalmente em pacientes com doença inicial.
      • No entanto, a decisão de usar a inibição de TNF comoterapia inicial deve levar em consideração os riscos, benefícios, acesso, custo e a preferência do indivíduo.
    • Não há diferença entre associar DMARDs à demais terapias, comoiPDE4i, iTNF, iIL-17, iIL-12/23, iIL-23 e iAK
  • Para pacientes com resposta inadequada aos MMCDs
  • Evidências de alta qualidade apoiam uso do: iTNF, iIL-17, iIL-23 e iJAK (magnitude do tamanho do efeito semelhante)
    • Eficácia dos iIL-17 e iTNF são comparáveis
      • 1 ECR comparando Upadacitinibe 30 mg x adalimumabe mostrou superioridade do iJAK, porém a superioridade consistente dos iJAK sobre outros MMCDb ainda não foi demonstrada
    • A inibição de IL-23 é recomendado, porém não foram feitos estudos diretos.
  • Evidências moderadas apoiam: iIL-12/23 ou iPDE4 (menor magnitude do tamanho de efeito)
  • Um pequeno estudo aberto comparando a inibição de IL-12/23 com a inibição de TNF não mostrou a superioridade da inibição de IL-12/23 sobre iTNF.
  • Pacientes com experiência anterior com bDMARDs
  • iTNF, iIL-17, iIL-23 e iJAK são fortemente recomendados
  • A inibição da PDE4 é condicionalmente recomendado.
  • A limitação para essas recomendações é que as evidências foram derivadas de pacientes com Apso que apresentavam predominantemente poliartrite, com evidência extrapolada para oligoartrite e outros fenótipos.
Doença axial
  • Recomendação condicional: injeção com glicocortioides em sacroiliacas
  • iTNF e iIL17 tem eficácia em axSpA radiográfica e não radiográfica
  • Estudos fases II e ECRs de fase II-III demonstraram a eficácia dos iJAK (tofacitinib, upadacitinib e filgotinib) na espondilite anquilosante e as evidências foram extrapoladas para apso axial.
    • Apenas um estudo foi desenhado especificamente para avaliar apso axial. Neste ensaio clínico randomizado (ECR) de fase IIIb, o iIL-17 (secuquinumabe) demonstrou melhora significativa em comparação ao placebo.
  • IL-12/23 e inibidores de IL-23:
    • Não têm demonstrado eficácia na anquilosante espondilite.
    • No entanto, análises post hoc dos ensaios de ustekinumab e guselkumab em apso axial sugerem que esses agentes possam ser eficazes, mas a evidência é atualmente limitada e conflitante de tal forma que esses medicamentos não são recomendados
Dactilite
  • Recomendação condicional: metotrexato, AINE, injeção com glicocorticoide, iPDE4 CTLA4-Ig (abatacepte)
    • Estudo SEAM-PsA RCT: não foi encontrada diferença significativa entre a monoterapia com metotrexato, monoterapia com etanercepte e a terapia combinada metotrexato-etanercept. Porém, nenhuma conclusão definitiva sobre o tamanho do efeito pode ser tirada devido à falta de um grupo de controle placebo
    • Abatacept (CTLA4-Ig): melhor que placebo em 24 sem
  • Recomendação forte: iTNF, iIL-12/23, iIL-17, iIL-23, iJAK e iPDE4
    • iIL-17 (secuquinumabe, ixequizumabe e brodalumabe): demonstraram eficácia superior ao placebo em ECR.
    • iIL-23 (guselkumab e risankizumab): considerados eficazes para dactilite
    • iTNF X iIL-17: sem diferença estatisticamente significativa entre eles
    • iJAK: em resultados secundários foram considerados estatisticamente superiores ao placebo na maioria dos estudos
    • iJAK (upadacitinib) x TNF (adalimumabe): eficácia semelhante
Entesite
  • Recomendação forte: iTNF, iIL-17, iIL-12/23, iIL-23, iJAK e iPDE4.
  • Nenhuma das classes de medicamentos avaliadas apresentou superioridade consistente sobre a outra.
  • O metotrexato recebeu recomendação condicional
    • A mudança foi feita com base na opinião de especialistas e dados emergentes do estudo SEAM-PsA, no qual a eficácia sugerida do metotrexato foi semelhante ao observado para o etanercepte.
      • No entanto, o estudo SEAM-PsA não incluiu um braço placebo, portanto, a evidência é limitada🤷‍♀️
  • O uso de AINEs, injeções locais de glicocorticóides e fisioterapia foi condicionalmente recomendada, apesar da falta de estudos de alta qualidade
Pele
  • Agentes tópicos
    • Os agentes são fortemente recomendados como tratamento de primeira linha para o envolvimento limitado da área de superfície corporal.
  • Psoríase disseminada ou refratária ao uso de agentes tópicos
    • A fototerapia, terapias orais (metotrexato, ciclosporina, iPDE4 e iJAK) e MMCDb (iTNF, IIL-17, iIL-12/23 e iIL-23) são opções fortemente recomendadas.
      • iIL-17, iIL-12/23 e iIL-23 – maior eficácia para envolvimento da pele do que os iTNF em estudos de psoríase e/ou Apso.
  • Acitretina (retinóide oral): recomendação condicional
    • Eficácia limitada como monoterapia para psoríase em placas e evidências escassas em apso. Pode ser eficaz para a psoríase pustulosa.
  • A leflunomida, sulfassalazina e CTLA4-Ig (abatacepte) têm evidência limitada.
Psoríase ungueal
  • Evidência limitada ao apresentado em ECRs para Apso
  • Recomendações fortes
    • MMCDb: evidências de boa qualidade de ECRs (iTNF, iIL-17, iIL-12/23 e iIL-23)
  • Recomendações condicionais
    • Tópicos de calcipotriol e glicocorticóides, tacrolimus tópico, ciclosporina tópica, glicocorticoide intralesionais e laser pulsado.
    • Medicamentos sistêmicos: ciclosporina, metotrexato, acitretina, iJAK e iPDE4.
Condições relacionadas
Doença inflamatória intestinal (doença de Crohn e retocolite ulcerativa)
  • Recomendação forte
    • iTNF (com exceção do etanercepte) e iIL-12/23
  • Recomendação condicional
    • iJAK:
      • Tofacitinibe foi eficaz na colite ulcerativa
      • 1 ECR de fase II na doença de Crohn não atingiu desfecho primário
      • resultados promissores estão emergindo de ECRs de fase II para a eficácia e segurança de outros inibidores de JAK (upadacitinib e filgotinib) e IL23.
    • Metotrexato:
      • Dados de ensaios clínicos randomizados mostrou eficácia na doença de Crohn e colite ulcerativa
  • iIL-17 (secuquinumabe e brodalumabe) exacerbou a doença de Crohn em ECRs de pacientes e deve portanto, ser evitado
Uveíte anterior não infecciosa
  • Recomendação condicional
    • Metotrexato
    • iTNF (excluindo etanercept) – recomendação condicional
      • ECRs recentes mostraram forte evidência para o uso de adalimumabe,
  • Etanercept é fortemente desaconselhável
    • Eficácia inferior
    • Potencial para exacerbação de uveíte em comparação ao monoclonais
  • Nenhuma medicação possui recomendação forte.

🔠Abreviações: iTNF: inibidores do TNF; iJAK: inibidores da janus quinase; iIL-17: inibidores de IL17; iIL-23: inibidores da IL23; iIL12/23: inibidores da IL 12/23; iPDE4: inibidores da fosfodiesterase IV; GC: glicocorticoides; MTX: metotrexato;MMCDs: medicamentos modificadores do curso da doença sintéticos; MMCDb: medicamentos modificadores do curso a doença biológico

📚Referência

Coates, L.C., Soriano, E.R., Corp, N. et al. Group for Research and Assessment of Psoriasis and Psoriatic Arthritis (GRAPPA): updated treatment recommendations for psoriatic arthritis 2021. Nat Rev Rheumatol (2022). https://doi.org/10.1038/s41584-022-00798-0

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